• आयुर्वेद – āyurveda e yoga

    Hoje em dia é difícil encontrar um curso de āyurveda sem referências ao yoga e um curso de yoga sem referências ao āyurveda. Oriundas das mesmas fontes de conhecimento, āyurveda e yoga são utilizados como parte de um sistema holístico e complementar mas, qual é a visão dos clássicos de āyurveda em relação ao yoga?

    Num capítulo do caraka samhitā, provavelmente o livro mais importante do āyurveda, exploram-se as razões que levam ao sofrimento do ser humano.

    Comprometimento das faculdades mentais

    Quando as três faculdades mentais cruciais – dhi, dhriti e smṛti – estão comprometidas, causam sofrimento.

    dhi, a capacidade de compreender, quando prejudicada, distorce nossa percepção da realidade. dhriti, o poder do autocontrole, fica enfraquecido, permitindo que a mente se entregue a atividades prejudiciais. Enquanto isso, smṛti, o poder da memória, quando obscurecido pela influência de rajas e tamas, obstrui a capacidade de memória acerca dos conhecimentos essenciais. Estas deficiências desencaminham-nos, e alimentam ações que causam sofrimento.

    prajñāpāradha: O Erro do Intelecto

    Quando o intelecto vacila, fazemos ações desfavoráveis que levam a desequilíbrios físicos e mentais. Este “defeito intelectual” manifesta-se de várias formas, desde negligenciar métodos de tratamento adequados até ter comportamentos prejudiciais motivados por emoções negativas, como medo, raiva e ganância. Estas ações, decorrentes de um intelecto equivocado, são o princípio doença e da angústia.

    A influência do tempo: kāla

    O tempo, uma força subtil mas potente, desempenha um papel significativo na formação da nossa saúde e bem-estar. As variações sazonais, dos ritmos digestivos e dos ciclos diários têm um grande impacto no nosso equilíbrio fisiológico. As doenças manifestam-se com a mudança das estações, durante horários específicos da digestão e até mesmo em determinadas horas do dia ou da noite.

    Desvendando o Destino: daiva

    O conceito de destino, lembra-nos dos fundamentos kármicos da nossa existência. As ações passadas, influenciam as nossas circunstâncias presentes, incluindo a nossa saúde. Algumas aflições ocorrem devido a impressões kármicas profundamente enraizadas, transcendendo as intervenções terapêuticas convencionais. A aceitação desta ordem cósmica é essencial para enfrentar os desafios da vida com equanimidade.

    Equilíbrio Sensorial: asātmya indriyārtha saṃyoga

    O contacto dos sentidos com os seus objectos devem ser feitos de maneira apropriada. Quando indevidamente utilizados, os sentidos tornam-se canais de aflição. Os efeitos prejudiciais da má gestão sensorial passam pela exposição a estímulos exagerados até a indulgência em prazeres sensoriais prejudiciais. É necessário que o contato benéfico seja respeitado e que o contato prejudicial seja abandonado para a manutenção de uma boa saúde.

    Conclusão do caraka (de acordo com traduções disponíveis)

    A felicidade e o sofrimento geram desejos na forma de gostos e desgostos, respectivamente. Então, esse desejo é a causa responsável pela felicidade e pelo sofrimento.

    A mente e o corpo juntamente com os órgãos dos sentidos são os locais de manifestação de felicidade e sofrimento.

    A única referência a yoga no caraka samhitā vem após esta exposição e diz o seguinte:

    योगे मोक्षे च सर्वासां वेदनानामवर्तनम् |

    मोक्षे निवृत्तिर्निःशेषा योगो मोक्षप्रवर्तकः

    Num estado de yoga e mokṣa, as sensações tornam-se não existentes.

    yoga é um meio para atingir mokṣa.

    A felicidade e o sofrimento são sentidas devido ao contato da ātmā com os órgãos dos sentidos, a mente e os objectos dos sentidos. Ambos os tipos de sensações desaparecem quando a mente está concentrada e contida no ātmā e os poderes sobrenaturais da mente e do corpo são alcançados. Este estado é conhecido como yoga, de acordo com os sábios versados nesta ciência.

    Como vimos em artigos anteriores, o objectivo exclusivo do caraka samhitā é manter o equilíbrio do corpo. Ainda assim, ao referir as diferentes causas do sofrimento, dá a entender que, embora haja maneiras de manter equilíbrio, a única solução permanente para as alternâncias entre felicidade e sofrimento é mokṣa. Aqui, o yoga é simplesmente mencionado como um meio para atingir mokṣa.

    Não fica claro que “yoga” é referido mas podemos assumir que será diferente do que hoje em dia pensamos como yoga. O que fica claro é que estas duas ciências têm andado de mãos dadas nos últimos milénios.

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  • Sātmya Ricardo Barreto

    आयुर्वेद – Sātmya

    O termo Sātmya é traduzido como hábito, adequação, salubridade ou o alinhamento com a constituição natural de um indivíduo. Sātmya é relevante na manutenção da saúde e além disso, desempenha um papel crucial na gestão eficaz de várias doenças. Sātmya é importante como parâmetro de avaliação em exames de pacientes e varia com base em fatores como região geográfica, estação do ano, doença, uso repetido, etc.

    Deṣa Sātmya (região geográfica)

    O Āyurveda descreve diferente tipos de regiões geográficas, baseadas na predominância dos doshas. Por exemplo, os residentes de terras pantanosas, dominadas pelas qualidades snigdha (untuoso) e guru (pesado), são aconselhados a adotar uma dieta e estilo de vida que contrabalançam essas qualidades. Isto pode envolver a incorporação de alimentos secos e leves na sua rotina para manter uma saúde óptima. Então esta dieta é Sātmya para as pessoas que vivem em terras pantanosas.

    Outra faceta é Ṛtu Sātmaya (sazonal), o foco na adaptação às mudanças sazonais. Perante o stress ambiental extremo durante uma determinada estação, o corpo esforça-se por ajustar o seu ambiente interno. As ajudas externas tornam-se cruciais para uma adaptação mais harmoniosa a estes desafios. Como todos sabemos, durante o rigor do inverno, é aconselhável vestir roupas de lã para reter o calor interno. Procurar ambientes aquecidos protege o corpo do ar frio, enquanto consumir bebidas quentes e condimentos mais quentes acelera o metabolismo, e gera calor adicional. Uma dieta hipercalórica torna-se imprescindível para atender às elevadas demandas energéticas, combatendo eficazmente o frio. Ritu Sātmya, sublinha a necessidade de ajustes personalizados de acordo com as condições meteorológicas e as qualidades do ambiente prevalecentes.

    Em caso de doença (roga Sātmya), torna-se imperativo que os médicos reconheçam Sātmya como um fator contribuinte fundamental.

    Seguir as orientações de Sātmya não só auxilia no processo de recuperação, mas também serve como medida preventiva contra doenças futuras. Por exemplo se uma doença de vāta ocorreu por causa das suas características (seco, leve, etc), o tratamento e a habituação contrários a este servem de Sātmya para essa doença


    Passando para Oka Sātmaya, este conceito investiga práticas ou consumíveis que podem ser inerentemente prejudiciais, mas que podem ser adaptados ao corpo através da introdução gradual. Os exemplos incluem fumar cigarros ou consumir álcool – ações que, com o tempo, o corpo aprende a acomodar sem efeitos nocivos imediatos. Ênfase aqui no imediato. Outros exemplos podem ser comidas picantes, tornam-se Sātmya por habituação como, por exemplo, na Índia onde grande parte dos turistas tem dificuldade em aguentar o nível de picante de uma simples entrada num café ou restaurante.


    Roga Sātmya. Aqui, dietas e atividades são adaptadas para proporcionar alívio de doenças específicas. Por exemplo, ao lidar com um distúrbio Vāta caracterizado por secura, leveza e propriedades frias, a abordagem recomendada envolve adotar práticas, dietas e hábitos contrários a essas características e desta forma amenizar os sintomas e remover a causa da doença.

    Concluindo, Sātmya é uma pedra fundamental do Ayurveda, incorporando a profunda interconexão entre os indivíduos e seu ambiente. Este conceito, que reflecte a adaptabilidade e a adequação, estende-se, como vimos, a diversas dimensões. Vivemos num tempo em que existe uma tendência de homogeneizar a saúde e o bem estar, em que um tipo de alimentação e de estilo de vida irá beneficiar todas as pessoas da mesma forma. A abordagem holística do Ayurveda enfatiza a importância de alinhar o estilo de vida, a dieta e os hábitos com estes fatores inerentes para a preservação da saúde e prevenção de doenças. O conceito de Sātmya serve como princípio orientador, promovendo um equilíbrio harmonioso entre os indivíduos e a dinâmica em constante mudança do mundo ao seu redor.

    Ricardo Barreto

    Terapeuta de Ayurveda

    Inspirado no livro Āyurveda and Principles of Panchakarma da Dr. Mandip G

    Foto de Pixabay

  • Ricardo Barreto

    आयुर्वेद – Filosofias por detrás do āyurveda

    O āyurveda germinou numa vasta e variada paisagem de darśanas. A palavra darśana pode ser traduzida como visão válida ou instrumento para obter uma visão válida.

    Normalmente a palavra darśana é traduzida como filosofia mas analisando bem existe uma diferença entre o que no oeste chamamos filosofia e darśana. Enquanto na sua grande maioria, a filosofia no oeste lida com o conhecimento e os mistérios do mundo, tende a não ter um destino definido enquanto darśana tem como seu destino a cessação do sofrimento e a libertação.

    O āyurveda enquanto ciência, fez uso de várias darśanas, para a compreensão do universo e da natureza da realidade. A partir destas delas observou, descreveu e entendeu os factores causativos da manutenção de saúde e tratamento da doença.

    Uma breve introdução às darśanas que influenciaram o āyurveda:

    sāṃkhya de maharṣi kapila

    kapila descreve 24 princípios na criação do Universo, incluindo a forma não manifesta, a inteligência cósmica, o Eu, objectos de percepção, sentidos, faculdades motoras e 5 elementos.

    Apresenta prakṛti e puruṣa como avyakta (não manifesto) e explica o desenvolvimento do universo a partir deste estado.

    nyāya de maharṣi gautama

    Enfatiza a obtenção de conhecimento por meio de provas (pramanas) e lógica crítica.

    Descreve quatro fontes de conhecimento: percepção directa, inferência, analogia e palavras de uma autoridade.

    vaiśeṣika de maharṣi kanada

    Descreve a teoria atómica da criação

    Descreve as substâncias causadoras do Universo, incluindo éter, ar, fogo, água, terra, o Eu, mente, tempo e direção.

    Introduz seis categorias: substância, qualidade, ação, relação semelhante, relação dissimilar e relação inseparável.

    mīmāṃsā de maharṣi jaimini

    Envolve investigação para chegar à verdade e é baseado nos Vedas.

    Enfatiza rituais espirituais e disciplina para a libertação através do cumprimento do dharma (dever).

    vedānta de maharṣi bādarāyana/ veda vyāsa

    Explora o conhecimento e realização do Eu.

    yoga de maharṣi patañjali

    Descreve os 8 ramos do yoga para autodisciplina e libertação (mokṣa).

    Com base nestas 6 escolas, o āyurveda criou uma escola independente de pensamento.

    sāṃkhya – teoria de evolução, o entendimento e aplicação da triguṇa (sattva, rajas e tamas)

    yoga – fisiologia da mente e as suas patologias e mais contemporaneamente assimilou as práticas de yoga

    nyāya -métodos de investigação

    vaiśeṣika – 6 factores causativos, a indivisibilidade da unidade mais subtil

    mīmāṃsā – terapias espirituais, mantras, rituais de iniciação, metodologias de ensino, liberdade através do cumprimento do dever (dharma)

    vedānta – conceitos de pañcikaraṇa e paramātmā, brahma é eterno e imutável, a conquista final de cada ser humano. 

    Ainda que influenciado por estas filosofias o ayurveda mantém uma posição independente pois o seu objectivo é ligeiramente diferente das outras filosofias. 

    O objectivo do ayurveda é a manutenção da saúde e a erradicação das doenças para que a pessoa possa então prosseguir na conquista dos seus puruṣarthas.

    Ricardo Barreto
    Terapeuta de Ayurveda

    Foto de Tingey Injury Law Firm, Unsplash

  • A Harmonia do Ser

    आयुर्वेद – Harmonia do Ser: Abordagem Holística do Ayurveda

    A abordagem holística do Ayurveda está directamente ligada à interconexão de sharira (corpo), indriya (sentidos), sattva (mente) e ātmā (o Eu). Esta perspectiva  diz que o nosso bem-estar e saúde está dependente do alinhamento harmonioso destes elementos fundamentais.

    sharira

    O corpo é onde o Eu assenta. É formado pelos 5 elementos fundamentais, espaço, ar, fogo, água e terra. É organizado por doshas, dhatus (tecidos corporais) e malas (excretas). O corpo é um dos lugares onde a saúde e a doença se expressam.

    Compreender como os doshas, dhatus e malas são impactados directamente pelas nossas acções e hábitos é fundamental dentro da sabedoria ayurvédica. Das escolhas alimentares às práticas de estilo de vida, o Ayurveda ensina-nos a nutrir o nosso corpo de uma forma que este mantenha o seu estado natural, promovendo o equilíbrio e a vitalidade.

    indriya

    O termo “indriya” abrange tanto as faculdades sensoriais como as faculdades motoras, abrange também o sistema interno de percepção do conhecimento. No Ayurveda, a noção de indriya vai além da mera existência estrutural de órgãos dos sentidos, como olhos, ouvidos, nariz, pele e língua. Cada sentido possui a capacidade de estabelecer uma conexão com a consciência e pode evoluir para um sentido intensificado na presença da mente e do Eu. 

    De acordo com o āyurveda, o processo de cognição começa dentro da pessoa. o Eu expressa vontade de percepção do conhecimento através da mente. A mente então conecta-se com o sentido particular. Este procura e conecta-se com a fonte para saber sobre aquele objeto específico. De um certo ponto de vista, a decisão de coisas boas/más, corretas/incorretas dependem da coordenação dos órgãos dos sentidos, dos sentidos, do intelecto, do Eu.

    Desta forma, a saúde dos sentidos é fundamental para o equilíbrio pois servem como portas entre o mundo externo e nossa paisagem interna.

    sattva

    Num contexto āyurvédico a palavra sattva é muitas vezes como sinónimo da mente visto sattva ser a sua natureza.  Já vimos que tem um papel importante no processo de cognição. É com a mente que pensamos, analisamos, ponderamos, criamos hipóteses, nos concentramos, temos auto controle, etc.

    Desta forma é importante cultivar uma mente tranquila, com qualidades de pureza e da clareza para que desta forma possamos tomar decisões apropriadas. O Ayurveda ensina que uma mente serena é indispensável para o bem-estar geral. Aprimorar o nosso discernimento, exercitar perseverança e conhecimento do Eu são terapias recomendadas como práticas que promovem equilíbrio mental.

    ātmā

    De acordo com o āyurveda, ātmā não é afectado por doenças, é eterno, é o observador de todas as actividades. Entre outros é responsável pela consciência, individualidade, usufrui do resultado das acções e mantem a memória individual

    O reconhecimento do ātma, a nossa essência é também parte de um bem-estar holístico. É importante descobrir como alinhar as nossas ações com nosso Eu superior e desenvolver um profundo senso de propósito, realização e conexão com o universo.

    A abordagem holística do Ayurveda, fundada nos pilares sharira, indriya, sattva e ātmā, convida-nos a embarcar numa jornada de autodescoberta. À medida que aprimoramos o equilíbrio destes elementos, encontramos não apenas saúde física e mental, mas também uma existência harmoniosa que ressoa com os ritmos eternos do universo.Ricardo Barreto
    Terapeuta de Ayurveda

    Foto de Nandhu Kumar

  • Como tornar a sua refeição ayurvédica por Ricardo Barreto

    आयुर्वेद – Como tornar a sua refeição ayurvédica

    A alimentação é um dos pilares da saúde mais importantes no ayurveda. Nas redes sociais e na internet passa-se muitas vezes a ideia de que uma receita de comida indiana é ayurvédica. Naturalmente a comida indiana utiliza muitos ingredientes que estão descritos nos textos clássicos mas muitas vezes, estes não são preparados nem consumidos de forma adequada. Então vamos ver como podemos tornar a nossa refeição ayurvédica.

    Apetite e digestão: a chave para a absorção de nutrientes

    A nossa digestão é considerada a base de uma boa saúde. Para melhorar a digestão, é preciso sintonizar com sinais de fome do corpo. Coma apenas quando tiver apetite de verdade, não pela hora ou a situação. Comer sem fome pode levar à comida não ser digerida nem absorvida apropriadamente e isto é suficiente para criar desequilíbrios no corpo especialmente se for feito repetidamente. Respeite sua fome, se sente que não tem apetite para a refeição tente fazer jejum. O mesmo se aplica em casos de indigestão.

    Quantidade certa: manter a digestão equilibrada

    O Ayurveda incentiva a moderação em todos os aspectos da vida, e a alimentação não é excepção. Sobrecarregar o prato é sobrecarregar o sistema digestivo e perturbar o equilíbrio do corpo. A quantidade ideal de comida é aquela que garante que o nosso fogo digestivo não se extinga nem por falta de combustível nem por excesso dele. Tente sempre acabar de comer antes de estar com a satisfação a 100%.

    Ingredientes frescos e sazonais: a recompensa em cada prato

    A natureza fornece diferentes alimentos em diferentes estações para ajudar o nosso corpo a adaptar-se às mudanças ambientais. Escolha uma variedade de frutas e vegetais coloridos, grãos integrais e legumes da estação. Isto não só garante que a sua refeição esteja repleta de nutrição, mas também que esteja alinhada com os ritmos naturais. Dê ênfase a ingredientes frescos, sazonais e de origem local.

    Sem distrações: comer com consciência

    Coma com o mínimo de distrações. Desligue a TV, guarde o telefone e saboreie cada garfada. Preste atenção aos sabores, texturas e aromas da comida. Comer devagar permite que o corpo entenda os sinais de saciedade evitando comer demais. Esta abordagem consciente promove uma conexão mais profunda entre o corpo e a alimentação.

    Alimentos para a saúde e a recuperação: adaptando sua dieta às suas necessidades

    A alimentação, além de manter a saúde, também é um tratamento. Cada pessoa é única e a sua condição de saúde ou de doença varia. As recomendações alimentares devem estar adequadas ao estado da pessoa. Os hábitos alimentares de uma pessoa doente não devem ser os mesmos de uma pessoa saudável. Muitas vezes não tomar uma refeição, simplificar uma receita, evitar certos alimentos, usar diferentes especiarias é suficiente para redirecionar o corpo para um estado de equilíbrio. De forma geral, consumir comida quente, leve e não muito seca é recomendado.

    Incorporar ayurveda nas refeições vai além de estilos culinários e ingredientes indianos. Uma refeição ayurvédica resulta da aplicação de princípios baseados na manutenção da digestão e nutrição dos tecidos corporais com alimentos saudáveis processados de forma adequada. Além disso, é uma abordagem consciente e intencional para nutrir o corpo. Existem outros factores como os 6 sabores, os alimentos incompatíveis que também devem ser levados em consideração mas ao abraçar estes simples cinco aspectos – apetite e digestão, quantidade certa, ingredientes frescos e sazonais, comer com consciência e adaptar a sua dieta às suas necessidades – pode transformar a sua refeição numa refeição ayurvédicas; uma refeição que não crie desequilíbrios no corpo e seja fonte de vitalidade e bem-estar.

    Até já!

    Ricardo Barreto

    Terapeuta de Ayurveda

  • आयुर्वेद – Como viver uma vida realizada: Sabedoria do Caraka Samhita

    O Caraka Samhita é indiscutivelmente o texto clássico de referência de ayurveda. Supostamente terá sido compilado por volta de 1500 AC e contém nele conhecimentos profundos sobre a biologia humana. Encontramos também conceitos que esclarecem a natureza holística do ser humano, a constituição individual, os cinco elementos fundamentais, os meandros da digestão, do metabolismo e muitos outros. Estes conceitos servem como pilares de conhecimento que contribuem significativamente para o estudo, a prática e pesquisa de ayurveda até aos dias de hoje.

    O texto pinta um quadro vívido do que significa viver verdadeiramente, e não apenas de existir, mas de prosperar.

    A vida ideal, definida

    Uma vida de verdadeira realização é aquela em que o corpo e a mente estão em harmonia, livres de doenças. É uma vida marcada pela exuberância da juventude, um espírito robusto, força física e uma boa reputação. Uma vida verdadeiramente plena incorpora as qualidades de coragem e uma compreensão das artes e das ciências.

    Uma vida de riqueza sensorial

    Na busca por uma vida plena, os sentidos desempenham um papel fundamental. O texto incentiva-nos a abraçar uma vida de riqueza sensorial, onde nossos sentidos são saudáveis e os objetos de nossa percepção sensorial são uma fonte de alegria. Por outro lado é também uma vida marcada por uma capacidade inata de discernir o que é verdadeiro e o que é falso, que é permanente e o que é passageiro.

    Liberdade , autonomia e o caminho virtuoso

    Talvez um dos aspectos mais marcantes de uma vida plena seja a liberdade de seguir os próprios desejos. Aqueles que vivem uma vida assim têm o poder de atingir os seus objetivos e a liberdade. Este senso de autonomia é essencial para a felicidade. Mas uma vida que vale a pena viver não envolve apenas ganhos pessoais. O texto lembra-nos da importância de desejarmos o bem a todos os seres, mostrando que nossa felicidade está intrinsecamente ligada à felicidade dos outros. Exige uma vida livre do desejo pela riqueza dos outros, marcada pela veracidade, pelo amor à paz e por ações ponderadas.

    Acto de equilíbrio

    Para saborear verdadeiramente a essência da vida, o texto enfatiza a necessidade de equilíbrio. Isto significa experimentar os objectivos fundamentais da vida – dharma, artha, kama e moksha – sem que um comprometa o outro. Envolve respeitar nossos superiores e servir os mais velhos com a maior reverência.

    Auto-domínio

    Uma vida plena também envolve auto domínio . Quem segue este caminho têm controle inabalável sobre sua luxúria, raiva, inveja, arrogância e orgulho. A pessoa entrega-se a actos de caridade, meditação, aquisição de conhecimento e abraça a tranquilidade da solitude.

    Uma busca por conhecimento e espiritualidade

    Na busca por uma vida significativa, o conhecimento desempenha um papel crucial. Aqueles que levam uma vida verdadeiramente benéfica são versados nas artes e nas ciências e são devotados à sabedoria espiritual. Trabalham incansavelmente, não apenas no presente, mas com um olhar atento para a próxima vida, e são abençoados com memória e inteligência.

    Concluindo, o texto em seja um texto de medicina geral, oferece-nos insights profundos sobre o que significa levar uma vida plena e verdadeiramente significativa. Lembra-nos que a verdadeira felicidade não é apenas a ausência de dor e sofrimento, mas a presença de alegria, equilíbrio e um compromisso inabalável com o bem-estar de todos os seres. É uma vida bem vivida, repleta de sabedoria, virtude e uma busca incessante por conhecimento e espiritualidade.

    Até já!

    Ricardo Barreto

    Terapeuta de Ayurveda

    Foto de Marian Strinoiu – pexels.com

  • Ricardo Barreto Terapeuta de Ayurveda

    आयुर्वेद – pāda abhyaṅga – rotina de oleação dos pés

    No Ayurveda, abhyaṅga refere-se à aplicação de óleo. Este óleo pode ser simples ou medicado. De forma geral esta aplicação de óleo pode, e por vezes deve ser personalizada com base na constituição do indivíduo, idade, estação do ano, doenças específicas e fatores ambientais.

    Seguindo os princípios descritos nos textos clássicos ayurvédicos a aplicação de óleo deve fazer parte de uma rotina diária pois desacelera o envelhecimento, ajuda na recuperação da fadiga e ajuda em problemas causados por vāta dosha. abhyaṅga refere-se à aplicação de óleo no corpo mas é dito que, na impossibilidade de a fazer na integra, a cabeça, os ouvidos e os pés são os locais que não devem ser descuidados.

    Hoje vamos falar brevemente de pāda abhyaṅga

    Alguns benefícios de pāda abhyaṅga

    • suaviza a rugosidade das solas dos pés
    • alivia a rigidez
    • corrige a secura excessiva
    • alivia a exaustão
    • trata da dormência nos pés
    • promove força e estabilidade nos pés
    • nutre os olhos, prevenindo diversas doenças oftalmológicas

    É também associada a uma melhora do sono, sistema nervoso, ansiedade, stress e outros.

    Procedimento

    • aquecer o óleo em banho maria até estar confortável ao toque
    • espalhar uma pequena quantidade de óleo nas mãos
    • com pressão moderada e lentamente:
      • massajar do tornozelo aos dedos dos pés
      • massajar cada dedo do pé individualmente, da base à cabeça
      • massajar o espaço entre os dedos
      • massajar as solas dos pés
    • massagem pode demorar entre 5 a 15 minutos por pé
    • colocar uma meia e deixar o tempo desejado *

    *Normalmente em ayurveda não é recomendado deixar o óleo no corpo mas no caso de pāda abhyaṅga, como se usa uma pequena quantidade até pode ser deixado durante o sono.

    Pode utilizar simples óleo de sésamo, oléo de amêndoas, azeite, ghee, etc ou um óleo medicado para o efeito.

    pāda abhyaṅga deve ser feito de estômago vazio portanto é normalmente recomendado como uma rotina matinal ou uma rotina de sono.

    pāda abhyaṅga e de facto quaisquer terapias de oleação devem ser evitados durante gripe, febres, indigestão, doenças de pele.

    Já experimentou?

    Até já!

    Ricardo Barreto

    Terapeuta de Ayurveda

    Foto de Towfiqu barbhuiya. pexels.com

  • Ricardo Barreto Ayurveda

    आयुर्वेद – Os 6 sabores de acordo com o āyurveda – parte 2

    A acção de cada um dos sabores é determinada pela sua composição relativa aos 5 elementos (como vimos no artigo passado). Hoje vamos ver brevemente as funções de cada um destes sabores e qual o seu impacto no corpo e mente.

    madhura – doce

    Tem as qualidades de frescura, peso e humidade/oleosidade.

    De uma forma geral o sabor doce promove a força dos tecidos corporais, promove a compleição e a longevidade. Dá prazer e satisfação emocional.

    Em excesso causa doenças de kapha e tecido adiposo, obesidade, problemas digestivos, letargia etc. Pode levar ao apego e à possessividade.

    Não está só presente no açúcar, mel e etc mas também em substâncias como o arroz , centeio, leite, batata frutas doces, etc

    amla – azedo

    Tem as qualidades de leveza, calor e humidade.

    De uma forma geral o sabor amargo em moderação aumenta o apetite, fogo digestivo. Causa a secreção de fluídos no corpo. Dá vigor à mente e aos sentidos.

    Em excesso causa problemas de visão, excesso de sede, acidez, problemas de pele, e outros problemas digestivos. Pode levar à inveja e à raiva.

    Está presente nos citrinos de forma geral mas também em iogurte, vinagres e fermentados.

    lavaṇa – salgado

    Tem as qualidades de peso, calor e humidade.

    De uma forma geral o sabor salgado em moderação aumenta o apetite e a digestão, estimula a produção de saliva, limpa os canais. Dá confiança e motivação.

    Em excesso causa inflamação, retenção de líquidos e velhice prematura (queda de cabelo, rugas, etc). Pode levar à ganância e excesso de ambição.

    Está presente nos sais e consequentemente em produtos salgados.

    tikta – amargo

    Tem as qualidades de frescura, leveza e secura.

    De uma forma geral o sabor amargo em moderação ajuda a secar excesso de muco e tecido adiposo, promove o intelecto, limpa a garganta, dá firmeza à pele. Dá insatisfação.

    Em excesso provoca a perda de força e doença de vāta. Pode levar à tristeza, pesar.

    Está presente em certas folhas verdes, especiarias como o a curcuma e o feno grego, no café, chá, etc

    kaṭu – picante

    Tem as qualidades de calor, secura e leveza.

    De uma forma geral o sabor picante em moderação promove secreções, ajuda na circulação, apetite e digestão e limpa os canais. Dá extroversão e coragem.

    Em excesso provoca perda de libido e força e inflamação, tonturas, e problemas de pele. Pode levar á violência, raiva.

    Está presente em especiarias e alimentos picantes como a malagueta, pimentas, gengibre, alho etc

    kaṣāya – adstringente

    Tem as qualidades de peso, secura e frescura.

    De uma forma geral o sabor adstringente em moderação purifica o sangue, reduz excesso de muco, ajuda a formar fezes, ajuda na cicatrização. Dá introversão.

    Em excesso provoca secura, obstipação com inchaço abdominal, reduz libido e pode levar à perda de tecido corporal. Pode levar a insegurança e medo

    Está presente em leguminosas, banana verde, raiz de lótus, quiabos etc.

    Excepções

    Existem algumas excepções, ficam aqui alguns exemplos

    • arroz com mais de 6 meses, cevada, feijão mungo, mel embora sendo doces tendem a não agravar kapha
    • romã e outros frutos silvestres embora azedos não tendem a agravar pitta
    • sal dos himalayas tende a ser menos prejudicial à visão
    • gengibre seco e alho sendo picantes não tendem a agravar vāta

    Esta foi só uma pequena introdução de como o āyurveda analisa os sabores e a importância da sua utilização para manter o equilíbrio do corpo. Por outro lado, mostra também como a alimentação pode ser utilizada para manipular os doshas.

    Até já!

    Ricardo Barreto

    Terapeuta de Ayurveda

    imagem de Vanessa Loring – pexels.com

  • Os 6 sabores de acordo com o āyurveda

    आयुर्वेद – Os 6 sabores de acordo com o āyurveda – parte 1

    Um dos factores para uma alimentação equilibrada de acordo com o āyurveda é o uso dos 6 sabores. Sabor, conhecido em sânscrito como rasa, é a sensação interpretada pela língua quando uma substância entra em contacto com ela.

    Os 6 sabores são um conceito único de āyurveda que define que, aparte da diferenciação a nível de experiência sensorial, cada um destes sabores tem uma função específica.

    Os 6 sabores são:

    • svādu ou madhu  – doce
    • amla – azedo
    • lavaṇa – salgado
    • tikta – amargo
    • uṣṇa ou kaṭu – picante
    • kaṣāya – adstringente

    Cada um destes sabores deve a sua composição a uma combinação de 2 dos 5 grandes elementos.

    • doce – terra e água
    • azedo – terra e fogo
    • salgado – água e fogo
    • amargo – ar e fogo
    • picante – ar e espaço
    • adstringente – ar e terra

    Cada um destes sabores têm um impacto directo nos doṣas. Levando em consideração a ordem apresentada anteriormente, podemos dizer que:

    • os 3 primeiros sabores (doce, azedo e salgado) tendem a agravar kapha e a pacificar vāta
    • os 3 últimos sabores (amargo, picante e adstringente) tendem a agravar vāta e a pacificar kapha
    • adstringente, amargo e doce tendem pacificar pitta e os restantes 3 (azedo, salgado e picante) agravam pitta.

    Estes sabores nutrem também o corpo em ordem sucessiva. Assim sendo o sabor doce é o que mais nutre o corpo e o adstringente o que nutre menos.

    Apenas com estas informações conseguimos ver a relevância dos sabores não só no contexto de tratamento como também na prevenção de saúde. Em artigos anteriores já falámos das alterações sazonais e o seu impacto nos doṣas e é com base neste conceito de rasa que surgem sugestões para modificações na dieta. Por exemplo, durante a primavera existe um agravamento natural de kapha e por isso a nível de alimentação o uso predominante de sabores doce, azedo e salgado são contra-indicados. Por outro lado, uma pessoa com doenças que tenham origem em pitta deverão ter a recomendação de evitar a predominância dos sabores azedo, salgado e picante.

    āyurveda recomenda o uso diário destes 6 sabores mas isto não quer dizer que devemos consumir os sabores nas mesmas proporções pois cada sabor tem a sua função portanto a sua predominância de cada sabor deve ser adaptado de acordo às necessidade do corpo e  às alterações sazonais.

    Na segunda parte do artigo vamos falar acerca das funções de cada um destes sabores e entender um pouco melhor em que substâncias se encontram pois quando dizemos sabor doce não estamos necessariamente ou directamente a falar de açúcar. 

    Até já!

    Ricardo Barreto

    Terapeuta de Ayurveda

    imagem de  Vanessa Loring – pexels.com

  • Ayurveda Especiarias

    आयुर्वेद – Āyurveda – Especiarias para melhorar a digestão

    O processo de digestão começa quando pensamos na comida. Cores, aroma, textura e sabor alteram a nossa experiência de consumo e de assimilação. Desta forma as especiarias melhoram o sabor da comida. São uma parte essencial da “alimentação ayurvédica” e devido às suas qualidades medicinais podem ser usadas para equilibrar os doṣas, aumentar a digestão, absorção de nutrientes, circulação, etc.

    Sendo a digestão um elemento central em questões de saúde e doença ficam aqui algumas especiarias que devem fazer parte de qualquer cozinha pois tem o potencial de ajudar na digestão ao mesmo tempo que ajudam a trazer sabor à comida.

    CARDAMOMO

    É considerado um excelente digestivo, especialmente benéfico na redução do inchaço e gases intestinais.

    É excelente para equilibrar kapha, principalmente no estômago e nos pulmões. Também é útil para pacificar vāta. As sementes são frequentemente mastigadas para refrescar o hálito.

    CANELA

    É frequentemente usado em preparações de ervas ayurvédicas para aumentar a bio disponibilidade de outras ervas.

    É excelente para pacificar Kapha e bom para equilibrar vāta também. Tende a aumentar pitta.

    No Āyurveda, a canela é usada para equilibrar a digestão e pacificar distúrbios estomacais. Combinado com outras ervas e especiarias quentes, como gengibre e pimenta preta, pode ser fervido em um chá de ervas para aliviar o desconforto associado a constipações.

    CRAVINHO

    Considera-se que o cravinho melhora a circulação, a digestão e o metabolismo e ajuda a combater distúrbios estomacais, como gases, inchaço e náusea. Muito usado em ingrediente em produtos de higiene bucal para promover a saúde dos dentes e refrescar o hálito.

    O cravo tem sabores picantes e amargos. O cravo ajuda a pacificar vāta e kapha e aumenta pitta.

    SEMENTES DE COENTRO

    é uma especiaria tridoṣa muito apreciada na Āyurveda. É um tempero refrescante e tem sabores doces e adstringentes. Os textos Āyurvédicos sugerem que é bom para a digestão, abre o apetite, ajuda a combater alergias e também ajuda a purificar o sangue.

    COMINHO

    especiaria aromática ligeiramente aromática e picante, ajuda na digestão e na secreção de sucos digestivos. Ajuda a eliminar as toxinas do corpo. Melhora o intelecto, alivia kapha, acção antioxidante.

    GENGIBRE EM PÓ

    é um tempero quente, de sabor picante. Ajuda a pacificar vāta e kapha e aumenta pitta. Está incluído em muitas formulações ayurvédicas devido às suas propriedades curativas. É útil para ajudar na digestão, aumentar o apetite, pacificar distúrbios estomacais e manter a saúde das articulações e do sistema respiratório.

    PIMENTA PRETA

    É considerado um importante tempero. É um ingrediente essencial em muitas formulações ayurvédicas. Possui propriedades de limpeza e antioxidante e ajuda a transportar os benefícios de outras ervas para diferentes partes do corpo.

    É excelente para pacificar kapha e vāta e aumenta pitta. Ajuda a melhorar a digestão e a circulação de nutrientes, estimula o apetite e ajuda a manter a saúde do sistema respiratório e das articulações.

    Ricardo Barreto

    Terapeuta de Ayurveda

  • Ayurveda Detox Ricardo Barreto

    आयुर्वेद – Āyurveda – Detox: Sim ou Não? – Parte 2

    Hoje vamos falar de pañcakarma, os 5 procedimentos.

    pañcakarma é um processo de purificação que tem como objectivo eliminar os doṣas em excesso do corpo e restabelecer o equilíbrio.

    Tradicionalmente estes são os 5 procedimentos

    • virecana – purgação terapêutica
    • vamana – vómito terapêutico
    • vasti / basti – “enema” terapêutico
    • raktamokṣaṇa – venecção
    • nasya – instilação nasal

    Cada uma destas terapias, devido à sua área de acção é considerada a melhor para cada um dos doṣas:

    • nasya e vamama na zona do corpo associada a kapha
    • virecana na zona do corpo associada a pitta
    • basti na zona do corpo associada a vāta

    Como referido anteriormente o objectivo de pañcakarma é eliminar os doṣas em excesso do corpo, vamos então ver, de acordo com os textos clássicos, quais poderão ser esses indicadores.

    Entre outros, estes são alguns exemplos de sinais de doṣas agravados:

    Indigestão, perda de peso excessiva, excesso de peso, anemia, sensação de peso, exaustão, fraqueza, mau cheiro do corpo, falta de energia, insónia ou sonolência excessiva, impotência, perda de força e tez apesar de uma dieta nutritiva.

    Tendo em consideração alguns dos exemplos listados podemos facilmente pensar que todos nós de uma forma ou de outra estamos a precisar de pañcakarma mas na verdade estes procedimentos só deveriam acontecer se os doṣas estiverem muito agravados.

    Embora pañcakarma seja, muitas vezes, promovida como experiência de spa, com pacotes na Índia de 4, 15, 20 dias, não é de facto, uma experiência muito prazerosa.

    Quando é bem feito, precisa de 3 etapas

    • uma etapa de preparação que normalmente passa por beber ghee/manteiga clarificada durante vários dias até chegar ao ponto de saturação e fazer várias terapias físicas de oleação e sudação.
    • uma etapa onde se aplicam os procedimentos de pañcakarma necessários que podem e normalmente deixam a pessoa fraca e com a digestão prejudicada
    • uma etapa pós tratamento que visa e trazer ao corpo força e vitalidade, e este é considerado o passo mais importante com reintrodução alimentar, rotinas diárias e formulações medicinais direccionadas ao rejuvenescimento.

    Se o processo de pañcakarma for bem sucedido na remoção dos doṣas em excesso do corpo e o restabelecimento do poder digestivo as doenças devem pacificar, a saúde da pessoa deve ser estabelecida, deve haver melhora a nível dos órgãos dos sentidos, da mente, intelecto e compleição, a pessoa deve sentir-se rejuvenescida. Da mesma forma, se o processo for feito de forma inadequada ou de forma excessiva claro, terá os resultados opostos aos benefícios.

    Então existem então algumas considerações a fazer.

    O āyurveda é de facto a favor da purificação do corpo. Esta purificação pode ser feita de forma mais solta com algum controle de alimentação, exercício físico e uso de substâncias que ajudem nesse processo (como referido no artigo anterior) ou, como vimos hoje por um processo de pañcakarma que embora apresente benefícios maravilhosos, é normalmente caro, longo e não muito agradável de se fazer.

    E apesar destas terapias de purificação serem recomendadas regularmente nos textos ayuvédicos como parte de uma rotina sazonal, se olharmos para o nosso contexto actual, existe uma grande diferença na maneira como vivemos e no que consumimos em termos de alimentos e percepções. A questão aqui é, se realmente não houver uma alteração nas coisas que fazemos diariamente será pañcakarma a solução a longo termo?

    Na última década, passei muitos meses no vaidyagrama, um hospital tradicional de ayurveda no sul da Índia e testemunhei resultados maravilhosos com pancakarma. Ao investigar o histórico destas pessoas, em muitos casos, a sua condição poderia, quase com toda a certeza, ter sido evitada por uma alimentação e estilo de vida mais conscientes.

    A prevenção é sempre a melhor cura.

    Ricardo Barreto

  • आयुर्वेद – Āyurveda – Detox: Sim ou Não? – Parte 1

    Será o detox nos dias de hoje mais importante do que nunca? Será o detox nos dias de hoje mais importante do que nunca? O que o āyurveda diz sobre “detox”?

    O conceito de detox está longe de ser novo, inúmeras culturas e religiões reconhecem o conceito de limpeza não só a nível do corpo mas também a nível mental e espiritual mas a verdade é que, hoje em dia, a palavra detox está em praticamente em qualquer círculo envolvido em serviços ou produtos de saúde e bem estar.

    Certamente nunca terá havido algum período na história em que estivéssemos mais expostos a poluição e a toxinas ambientais, no ar, na água, no solo (plásticos, pesticidas, cosméticos e produtos de limpeza). E como isso não fosse já por si problemático junta-se à lista uma quantidade alarmante de comidas ultra processadas e um estilo de vida sedentário. No nosso dia a dia, consciente ou inconscientemente, estamos expostos a estas substâncias “tóxicas” mas nem sempre o corpo sabe o que fazer com elas. Algumas destas toxinas são expelidas juntamente com as excretas e outras acumulam nos tecidos do corpo onde, temporariamente causam menos mal.

    O nosso corpo está programado para fazer detox: o nosso fígado, rins, pulmões, sistema digestivo e pele estão constantemente a desintoxicar-nos. O grande problema acontece quando nós sobrecarregamos estes órgãos ou sistemas do corpo e prejudicamos a sua capacidade de se auto desintoxicar. Então na verdade, nós não conseguimos fazer detox, nós simplesmente podemos facilitar o processo ao não nos expormos a “toxinas” ou a suportar estes órgãos a fazerem o seu trabalho com mais eficácia.

    No āyurveda o foco são os doṣas, os tecidos do corpo, os excretos (principalmente fezes, urina e suor) e o importante fogo digestivo. doṣas em desequilíbrio afectam e prejudicam a digestão que por sua vez prejudica os tecidos corporais e os canais de excreção. Desta forma o fogo digestivo, o sistema digestivo e tracto gastro intestinal tem um papel fundamental nos processos de purificação do corpo. 

    Quando a comida não é digerida apropriadamente torna-se numa “toxina” chamada āma.  A palavra āma pode ser traduzida como cru, não digerido, verde (contrário de maduro) e, como o nome indica, é que algo que não foi digerido apropriadamente pelo corpo. Se este āma não for eliminado pode movimentar-se pelo corpo, alojar-se nos tecidos e causar diversas doenças. Os sintomas de āma podem ir de fatiga, falta de energia, passando por diversos problemas digestivos (indigestão, prisão de ventre, diarreia, etc), problemas de circulação, dor e inflamação nas articulações até problemas mais graves como a aterosclerose, por exemplo. Este āma não deve então, de forma alguma permanecer no corpo.

    Um “detox” ayurvédico passaria primeiramente por digerir este āma.

    • Se for em pouca quantidade e se não estiver associado aos doṣas ou aos tecidos, o processo de digestão de āma pode passar por jejum na dieta, exercício físico, etc.
    • Se for em mais quantidade, a estas medidas adicionaria-se o uso de substâncias que ajudem a cozinhar o āma como por exemplo gengibre, pimenta preta, canela etc,
    • Se for em grande quantidade, outros procedimentos de pañcakarma (tópico do próximo artigo) seriam utilizados.

    Uma vez que o āma esteja cozinhado, os canais desobstruídos, os doṣas pacificados, o fogo digestivo equilibrado os diferentes sistemas do corpo funcionam de forma apropriada e o “detox” acontece naturalmente.

    Um modelo para um simples “detox” ayurvédico apropriado para pessoas saudáveis ou que, de forma geral não têm grandes problemas de saúde poderia passaria por:

    • favorecer comida vegetariana, leve, cozinhada e de fácil digestão
    • evitar ou mesmo eliminar lacticínios, fritos, alimentos crus, comidas ultra-processadas, etc
    • preferir canjas e sopas leves, fruta cozida
    • consumir água morna, chá de gengibre, cominhos, etc 
    • exercícios gentis sem muito esforço como yoga, caminhadas
    • descanso adequado, número de horas necessário, deitar cedo e cedo erguer
    • diferentes terapias de oleação e de suor

    Uma semana com esta rotina deverá ajudar o corpo a “desintoxicar” mas como sempre, a prevenção continua a ser o melhor remédio. Se não nos intoxicarmos com alimentos ou produtos alimentares insalubres, um dia jejum semanal ou quinzenal e actividade física regular são suficientes para manter o corpo limpo.

    Este artigo é simplesmente informativo e não substitui parecer profissional personalizado.

    No próximo artigo vamos falar mais detalhadamente acerca de pañcakarma, os processos que o āyurveda recomenda quando doṣas e āma estão em grande quantidade e faremos a nossa conclusão final.

    Até já!

    Ricardo Barreto

    Terapeuta de Ayurveda

    www.instagram.com/wayofayurveda_pt

    +351 925380997

  • आयुर्वेद -Āyurveda – O Mundo Moderno

    Āyurveda tem vindo a ganhar popularidade nas últimas décadas. Cada vez mais pessoas procuram abordagens naturais e holísticas para a saúde pois e apesar das suas raízes milenares, o āyurveda parece estar a tornar-se cada vez mais relevante no mundo moderno ao oferecer perspectivas únicas sobre saúde e bem-estar.

    Um dos princípios fundamentais do āyurveda é o princípio dos opostos. Este princípio define que o excesso de certas qualidades deve ser equilibrado com os seus opostos. Isto pode parecer básico pois é o que fazemos naturalmente por exemplo, com o uso de diferentes guarda roupas consoante o calor do verão e o frio do inverno. Mas vamos expandir um pouco mais este conceito.

    Ao olhar para o mundo moderno podemos constatar que este é rápido, irregular e instável. Ainda que existiram problemas em qualquer momento da existência humana, não será errado assumir que nunca houve uma altura em que mudanças se dessem tão rápido. Mudanças rápidas criam mais irregularidades e aumentam a instabilidade não só no mundo exterior como no mundo interior. Aplicando o princípio dos opostos, o remédio para algumas aflições do mundo moderno seriam calma, regularidade e estabilidade.

    āyurveda reconhece que para saúde e bem estar verdadeiros tem de haver equilíbrio a conexão entre o corpo, a mente, e o Eu. O corpo humano efectivamente não precisa de instruções. A nossa anatomia e fisiologia foi muito bem estruturada para dar sinais claros de quando precisa de manutenção, quando precisa de energia a fome chega, quando precisa de eliminar sentimos necessidades fisiológicas, quando sente frio treme, e por aí adiante. De uma forma simplista o corpo apenas requer que seja nutrido e usado adequadamente. A mente é mais complexa mas, de acordo com as ciências védicas, a sua natureza é sattva. A mente está equilibrada quando não está influenciada negativamente pela energia de rajas ou inércia de tamas. Uma mente equilibrada é uma mente presente e pacífica, capaz de navegar as manipulações dos gostos e das aversões. Finalmente, de acordo com o āyurveda, o Eu é eterno e não sofre qualquer tipo de aflições.

    Quando um carro está a ir rápido demais, de forma irregular e instável a coisa mais segura a fazer é mesmo parar.

    Da mesma forma, devíamos aprender a baixar o nosso ritmo excessivo nem que seja uns minutos por dia. Parar… respirar fundo… deixar a mente acalmar e de forma consciente voltar aos nossos afazeres. Quer queiramos quer não, o corpo gosta de rotinas. O corpo nutre-se ou desnutre-se dependendo da qualidade dos hábitos que criamos para eles. Portanto, ter uma rotina regular de saúde favorável ao desempenho do corpo é uma forma de criar regularidade e estabilidade.

    Com os desenvolvimentos tecnológicos e com a maneira como a tecnologia infiltrou quase todas as áreas das nossas vidas, acabamos por viver uma desconexão nunca vista em relação ao mundo natural. No contexto virtual, a tecnologia permite conectar mais pessoas do que nunca, mas será que estamos realmente mais conectados ao mundo real? Aos poucos fomos trocando tempo ao ar livre na natureza por entretenimento na TV, actividades lúdicas por consolas e telemóveis. Chegamos ao ponto de vermos famílias sentadas na mesma mesa e cada elemento a olhar para um aparelho que aos poucos se tornou a sua conexão com a realidade.

    Qualquer solução para os problemas do mundo moderno não passa necessariamente por mudar o que é, mas sim como aprender a lidar com tudo o que se encontra à nossa volta de forma mais saudável. Perceber as qualidades a que estamos expostos e nos causam desequilíbrios, usar princípios apropriados para nos equilibrarmos. Coisas simples como parar para respirar fundo, ter rotinas saudáveis, passar mais tempo na natureza e reavivar contacto humano são exemplos de como o āyurveda e outras ciências milenares terão sempre muito a oferecer pois os princípios sobre quais foram desenvolvidas não mudam.

    Ricardo Barreto

    Terapeuta de Ayurveda

    www.instagram.com/wayofayurveda_pt

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