A Necessidade de Uma Mente Madura para a Libertação
Vedānta é um caminho só de ida no qual é inevitavelmente necessário deixar para trás a tralha que só atrapalha a viagem. Isso passa obrigatoriamente por crescer emocionalmente, e quem não quiser crescer ou achar que não precisa de crescer, não conseguirá fazer a viagem e estará a enganar-se a si mesmo, lamentavelmente.
Para a pessoa com inteligência média assistir às aulas de Vedānta e ganhar o vislumbre do ensinamento não é assim tão difícil, especialmente se o professor for um comunicador hábil que transmita o conhecimento de forma simples e clara. De facto, é inevitável que esse vislumbre aconteça; irá certamente acontecer. Se a pessoa tiver foco mental e a fase da vida em que a pessoa assiste mais entusiasticamente às aulas for boa, é de esperar que a pessoa ganhe um entendimento superficial da natureza da realidade. Digo isto porque o Vedānta, sendo um pramāṇa, meio de conhecimento, funciona, é eficaz.
O entendimento não é tudo no Vedānta, é uma parte de um todo que precisa de ser completo para que o fruto do conhecimento se manifeste. O estilo de vida chamado de Yoga é uma parte importante e fundamental, sem a qual, Vedānta está destinado a fracassar. O Yoga deverá preceder o Vedānta – esta é a condição intransponível. Se deseja ganhar o conhecimento inabalável do Eu maior, da realidade, então, nesse caso, viva uma vida de Yoga.
Yoga é o processo de vida através do qual certas qualidades e virtudes são ganhas e a que chamamos de maturidade emocional e espiritual. A Bhagavadgītā, o maior tratado de Autoconhecimento e Yoga, menciona algumas – amānitvam, ausência da exigência de respeito, adambhitva, ausência de exibicionismo ou pretensão, ahimsā, não-violência, kṣānti, aceitação objetiva, arjavam, integridade ou alinhamento entre pensamento palavra e ação, etc. Noutras obras, outros mestres mencionam as virtudes que constituem em si a elegibilidade para o entendimento, chamadas de sādhana-catuṣtaya, o conjunto dos quatro meios (indiretos) para o conhecimento: viveka, discriminação e discernimento, vairāgya, desapego ou desprendimento, śamādi, calma e tranquilidade, etc. A lista das qualidades e virtudes a serem ganhas é grande e importante. Todos os mestres as realçam e não se cansam de lhes atribuir valor.
Sem o ganho destas virtudes a mente será instável, conflituosa, irrequieta e tremendamente problemática, causando muita aflição. As virtudes ou os valores incidem na mente, pois é na mente que grande parte do trabalho tem que ser feito, tanto a nível emocional como focal.
Sem emoções relativamente apaziguadas e sem capacidade de gestão emocional não há conhecimento que aguente e o vislumbre ganho na aula não impacta. Sem capacidade de foco continuado não há a possibilidade de contemplação séria e sem contemplação não há assimilação do conhecimento. As qualidades e valores a serem buscados pelo aluno de Vedānta tornam a mente um recipiente saudável onde o conhecimento permanece para ser apreciado. Caso contrário, a mente é como um recipiente rachado e disfuncional. O conhecimento esvair-se-á pelas rachadelas da sua mente e por mais que se queira retê-lo, a impossibilidade da retenção impõe-se tiranicamente.
Se a mente é o recipiente onde o conhecimento é recebido e retido, nutra-a. Diligentemente aprenda a melhorar a condição da sua mente. Impregne-a de compaixão, de compreensão, de calma, de discernimento, de foco, de paciência e de todos os valores que o Vedānta menciona.
Não tente contornar a tradição de ensino, pensando que é mais esperto ou sábio do que ela. Receba de coração aberto os ensinamentos, sejam sobre Yoga ou Vedānta, e entenda que sem maturidade a libertação é um castelo nas nuvens.
Maia, Março de 2023
Paulo Abreu Vieira